Deus lhe abençoe. Eu lhe vi. Eu lhe amo. Aparentemente, nada de anormal há nessas frases. Mas há.
Em todas elas, existe a ocorrência do “lheísmo”, fenômeno linguístico que consiste no uso do “lhe” no lugar do pronome “o”.
Ou seja, as frases gramaticais são “Deus o/a abençoe”, “Eu o/a vi”, “Eu o/a amo”.
Vamos abrir um parêntese para relembrar a noção de transitividade verbal.
Verbos transitivos são aqueles que precisam de complemento para ter sentido completo.
Se a ligação entre o verbo e seu complemento for direta, sem preposição, o verbo será “transitivo direto”.
Se a ligação for indireta, com uma preposição, o verbo será “transitivo indireto”.
Um exemplo de transitivo direto: “Ele viu o irmão”. Perceba que “irmão” completa o sentido de “ver” e faz isso desacompanhado de preposição.
Um exemplo de verbo transitivo indireto: “Ela gosta muito da mãe”. Note que “mãe” completa o sentido de “gostar” e faz isso acompanhado de preposição.
Às vezes, no lugar de substantivos como “irmão” e “mãe”, usamos os pronomes pessoais “o” e “lhe”.
Esses pronomes, porém, têm funções distintas: “o” substitui objeto direto, ao passo que “lhe” substitui objeto indireto.
As pessoas, no entanto, se esquecem disso e é aí que surge o “lheísmo”.
Muito comum no Nordeste, esse fenômeno tem como possível causa, além do desconhecimento da regra, uma predileção sonora.
Quem diz “Eu lhe amo” possivelmente o faz por não se sentir à vontade para dizer o formal “Eu o amo”, que, para alguns, pode parecer marca de afetação.
O que fazer então, aceitar ou combater o lheísmo?
As duas coisas. Nos registros mais informais, como na fala coloquial, não existe a necessidade de combatê-lo.
Em registros mais cultos, porém, especialmente na língua escrita, ele deve sim ser evitado.